Mais de três anos após o fim da pandemia da Covid-19, os internamentos sociais voltam a crescer de forma significativa no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Segundo o ‘Diário de Notícias’, o Relatório de Avaliação de Desempenho e Impacto do Sistema de Saúde (RADIS), apresentado durante a Convenção Nacional da Saúde, revelou que a taxa de internamentos sociais inapropriados aumentou quase 20% entre 2023 e 2025, enquanto os custos subiram 83%, atingindo 95 milhões de euros.
O estudo indica que a taxa de internamentos sociais passou de 10,5% em março de 2023 para 11,7% em março de 2025, o que representa 2.342 episódios, mais 20% face a dois anos antes. No mesmo período, a percentagem de camas ocupadas por doentes clinicamente estáveis, mas sem resposta social, subiu de 9,8% para 11,5%.
Esta tendência está concentrada sobretudo nas regiões de Lisboa e Vale do Tejo e do Norte, que representam 80% do total destes internamentos. O RADIS alertou que o fenómeno resulta da falta de respostas comunitárias e sociais, do envelhecimento populacional e da carência de recursos nas redes de apoio, constituindo um desafio na articulação entre saúde e proteção social.
O relatório recomendou o reforço da integração de cuidados e o desenvolvimento de alternativas ao internamento hospitalar, sob pena de uma “pressão orçamental continuada” e da “redução da capacidade efetiva para tratar a patologia aguda”.
Hospitais com mais de 100 camas ocupadas por doentes sociais
O presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (APAH), Xavier Barreto, confirmou ao ‘Diário de Notícias’ que a situação é “gravíssima” e tende a agravar-se com o envelhecimento da população. “Cerca de 11% das camas dos hospitais estão ocupadas com doentes que não deviam lá estar. Num hospital central, isso significa mais de 100 camas e milhares de dias de internamento”, explicou.
O responsável salientou que estas ocupações prolongadas têm impacto não só financeiro, mas também na eficiência hospitalar, nas listas de espera e na qualidade da prestação de cuidados. “Estas pessoas acabam por desenvolver outras doenças ou infeções hospitalares. Algumas acabam por morrer, quando nem deveriam estar internadas. Isto é gravíssimo”, alertou.
Xavier Barreto reconheceu ainda as dificuldades da Segurança Social em dar resposta atempada, devido à falta de camas em lares e unidades de cuidados continuados. Sublinhou que o problema “não será resolvido sem reformas profundas” e criticou a redução da meta do PRR, que previa cinco mil novas camas na rede de cuidados continuados e foi revista para apenas 800. “Sem camas de retaguarda, a sociedade não está preparada para a nova realidade demográfica”, afirmou.
Portugueses continuam a pagar mais do próprio bolso
O RADIS confirma ainda que os portugueses suportam cerca de 30% dos custos em Saúde, o dobro da média europeia. O relatório considera que esta diferença “evidencia uma pressão financeira significativa sobre as famílias”, que enfrentam barreiras económicas no acesso a cuidados essenciais, nomeadamente em medicina dentária, dispositivos médicos e medicamentos.
Apesar disso, o documento reconheceu alguns ganhos assistenciais, como a redução de 2 pontos percentuais no número de utentes sem médico de família, a diminuição da mortalidade evitável antes dos 75 anos e a estabilização da taxa de cirurgias em regime ambulatório em níveis elevados.
O relatório destacou também o crescimento de 71% na atividade do SNS24 desde 2023 e um aumento de 62% na hospitalização domiciliária desde 2020. No entanto, 4,9% das primeiras consultas continuam fora do tempo adequado, refletindo uma queda na capacidade de resposta do sistema de saúde.














